A distribuição interna de bens no Egito é basicamente fluvial. É natural que em um país constituído por um vale estreito e um longo rio, este se a principal via de comunicação. Isso se expressa através dos termos disponíveis na escrita hieroglífica mais específicos para indicar atividades comerciais no Egito: seguir a corrente e descer contra a corrente.
Entretanto, sair da região nilótica significa correr riscos. O mito de criação de Heliópolis, um dos mais antigos e importantes da história dessa sociedade, identifica o Egito, irrigado pelo Nilo, com a terra de Hórus, o deus benéfico, e região, a partir do deserto, com Seth, o maligno. A historiografia reforça essa ideia e valoriza a tendência de isolamento do Egito em relação aos vizinhos, fato geralmente atribuído aos seus limites geográficos naturais: o Mar Mediterrâneo ao norte; as cataratas; ao sul, e os desertos -da Líbia, o ocidental, e o que se forma entre a região nilótica e o Mar Vermelho, o oriental.
Aventurar-se rumo ao leste, seguir a costa do mar Mediterrâneo, atravessar as barreiras formadas pelas cataratas e rumar para o interior da África ou penetrar nos desertos ocidentais e orientais são desafios que se enfrenta somente para a conquista de algo raro, necessário, desejado. Inicialmente, os egípcios usam pequenas embarcações, tipo casca de árvore, feitas com feixes de papiro. Depois, iniciam a construção de barcos de madeira. A inexistência de madeira própria para a construção de navios, torna sua importação necessária desde os inícios do período dinástico.

Ao nordeste do Retjenu está a Assíria, sendo a região de Naharena, no Eufrates, normalmente, o limite da jornada para os egípcios. Além desse ponto, comerciam com Sangar, país montanhoso, situado entre o Eufrates e o Tigre, atualmente denominado Sindjar, e com a própria Assíria. É interessante notar que os egípcios nomeiam o rio Eufrates simplesmente de “água de Naharena”, considerado exótico pela direção em que correm suas águas. Por essas paragens, os egípcios também comerciam o lápis lazúli, cuja principal fonte é, na antigüidade, Badakshan, no Afeganistão, à época uma região muito próspera.
<—– O Antigo Egito em sua extensão máxima durante o período conhecido como Império Novo, por volta de 1 450 a.C
Um indício culinário indicador da antiguidade dessas relações remonta ao velho império, período em que o pão sírio se torna comum nas mesas faraônicas. Durante o Novo Império, o volume e a diversidade de produtos importados da Síria pelos egípcios aumentam em relação ao antigo Império e inclui uma diversidade maior de coisas. Na busca pelo raro, os egípcios se aventuram até mesmo nos temíveis desertos, o ocidental da Líbia e o oriental, entre a terra nilótica e o Mar Vermelho.
Muito antes que os navegadores da modernidade, os egípcios constroem um mito em torno do oriente – lugar mágico, onde o sol nasce e onde há um número grande de coisas importantes e raras, que lhe conferem o caráter de terra divina. Tal concepção, é comum em vários momentos da história. Os povos na antiguidade costumam imaginar que os países distantes, de onde vêm coisas preciosas, são habitados por criaturas extraordinárias. Eles acham difícil acreditar que as especiarias, por exemplo, provenham de plantas comuns.
A busca de coisas especiais para suas rotinas e cerimoniais leva os egípcios a empreitadas grandiosas, através de desertos e mares, confere-lhe um lugar especial na história e situa-o entre os que, na modernidade, chegam a novos continentes. Ao contrário do que normalmente se afirma sobre os antigos egípcios, eles são, com toda a certeza, elementos efetivos e ativos na busca milenar da humanidade pelo raro.